Ao querido Zé Nogueira!

Em pé: Beth, Maria Ines, Dani, Radesca e Nando Pires. Sentados: Débora, Zé Nogueira e Thaís.

Às vezes a vida nos brinda com coisas bastante inusitadas e boas. Raríssimas dessas oportunidades são amizades verdadeiras, de pessoas que acrescentam para nossas caminhadas existenciais.

Um desses casos ocorreu comigo quando conheci um senhor que tinha 47 anos a mais que eu. Devo tê-lo conhecido por volta de 2011, época em que eu tinha 34 anos e ele 81. Veja que a diferença era maior do que o dobro da minha idade.

Eu estava no Bourbon Street, casa de shows que fica em Moema (na capital paulista), lugar que já foi e ainda será palco de muitas aventuras que viverei! Lá estavam os produtores de algum show que não me recordo, quando fui apresentado àquele senhor de idade, que amava música, mas já não escutava tão bem e que estava vestido com um blazer bege, visivelmente elegante. Os olhos eram bastante azuis e sempre inclinados na direção de alguma moça bonita que passava pelo balcão onde ele estava sentado numa cadeira alta e eu estava em pé. Ambos bebíamos. Eu cerveja e ele algum drink meio tropical.

A primeira coisa que ele me disse foi que não tinha entendido nada do que o produtor que nos apresentou falou e tive que repetir quem eu era e o que fazia. Depois ele se apresentou de forma muito breve e já foi emendando com algum comentário sobre alguma das mulheres que tinha visto por ali.

Esse cara era o Zé Nogueira, ou simplesmente o Zé, como os amigos o chamavam.

Ele era o funcionário mais antigo da Rádio Eldorado, pertencente ao grupo Estado de São Paulo. Foi o responsável por trazer inúmeros artistas internacionais para fazerem shows no Brasil, incluindo nomes como Frank Sinatra e Louis Armstrong. Ele foi o produtor do programa que o Jô Soares apresentava sobre jazz na mesma emissora e protagonizou muitos outros shows, reportagens e produções de outros gigantes da música.

Adorava jogar futebol, esporte que praticava integrando o time “Namorados da Noite FC” do violonista, compositor e cantor, Toquinho, que sempre disputava ferozmente as partidas contra o Polytheama, de Chico Buarque.

Uma curiosidade é que apesar dele ser um amante do jazz, não gostava muito de quando os cantores faziam o “scat”, improvisos vocais com o uso de sílabas; como dubi, dubi ou coisa do tipo.

O Zé era um cara que conhecia todo mundo e que também era conhecido por todos, o que são duas coisas bastante diferentes! (risos) As portas sempre se abriam para ele e sob seu convite, algumas delas também vieram a se abrir para mim. Através de seu convite fui conhecer a Rádio Eldorado, para a qual passei fazer a correspondência em áudio de todos os festivais realizados pelo Bourbon Street, que cobri em Paraty e Ilhabela.

Uma das lembranças que não me falta à memória é a de um aniversário que ele me convidou. Foi em um bar de música latina que ele adorava e onde tradicionalmente comemorava todos os anos, o Azucar Club Cubano, que fica no Itaim Bibi em São Paulo. A princípio ele me disse que tinha em mente me apresentar para os diretores da Eldorado FM e do Grupo Estado de SP, mas ao chegar lá o encontrei feliz, embriagado e dançando sem parar com as bailarinas… Dessa forma, os planos de ampliação da minha network sucumbiram a sua alegria de viver e não passou do segundo drink! (risos)

Muitos outros festivais importantes (BMW, Samsung, BB…) e incontáveis shows aconteceram e, a presença do Zé era sempre garantida, até que seu filho adoeceu e ele se retirou um pouco do cenário musical para ajuda-lo com o tratamento. Depois disso eu o percebi mais fragilizado.

Depois disso se passaram mais alguns anos e contando tudo, desde o início, foram 9 de muita música e muitas histórias. Algumas insanas, outras engraçadas e muitas curiosas e informativas…

A última vez que encontrei com o Zé, foi no Bourbon Street Fest, em dezembro de 2018 e era visível que aquela pessoa até então inabalada pelo tempo, agora havia sido posta à prova da longevidade. Sua saúde parecia frágil e preocupou a todos os amigos. Na foto desse artigo ele está sentado, em meio a duas mulheres, com seu olhar maroto, exatamente com gostava!

Na semana passada recebi a triste notícia de seu falecimento (aos 89 anos) e quero deixar esse breve registro de uma das pessoas mais surpreendentes, inspiradas e apaixonadas pela música que já conheci. Ele virou até samba-enredo de uma escola samba de carnaval em Ilhabela, a cidade que adotou como sua, apesar de ter nascido em São Paulo. Ele realmente sabia escolher!

Um brinde ao querido amigo, Zé Nogueira!

E que todos tenham um excelente e muito musical final de semana!

P.S. Sem “scat”! (risos)

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